Como sugeriu Martin Jay, se os judeus podiam começar a sua oração mais importante com um «Ouve, ó Israel», a verdade é que os filósofos gregos podiam exigir um «Vê, ó Grécia». Isto porque, no entender do intelectualista Platão como no do sensualista Aristóteles, a visão domina a ordem do Sensível e é o vaso comunicante com a ordem do Inteligível. Os dois filósofos são os grandes responsáveis por uma mundividência ocular cedo revisitada pelos estóicos que determinou a própria identidade do pensamento grego em todos os seus campos, gerando uma constelação semântica que, em domínios aparentemente tão distintos como os da Física, da Dialéctica, da Poética e da Retórica, nivelou o conhecimento sob a égide da visão e do olhar. Aqui reside a raiz da differentia specifica das duas grandes civilizações da Antiguidade, já que em Roma seria o paladar a vencer em todo o léxico da teoria do conhecimento, originando aquela reverberação do sabor do saber que Roland Barthes tão sugestivamente viria a abordar na sua Lição.
Joana Matos Frias, "A Retórica da Visão na Poética Clássica".
in As Artes de Prometeu: Estudos em Homenagem a Ana Paula Quintela.
Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 2009.
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