Mozart, Sinfonia nº 40, K. 550, em sol menor
Orquestra de Câmara Escocesa
Maestro Sir Charles Mackerras
Sócrates diz que não se interessa pela natureza fisica, mas sim pelo homem e seus problemas. (Observo que no Evangelho não existe nenhuma descrição da natureza.) Subindo a colina da Acrópole, recordo-me que era aqui o centro da Atenas antiga, com seus protagonistas: o homem e a luz; o templo servia como testemunha dos dois. O que resta da Acrópole é suficiente para nos restituir o esquema de uma cultura artística fundada sobre o ritmo e a medida, a "divina proporção". Comparando a mozartiana sinfonia em sol menor K. 550 a uma figura destacada no frio das Panatenéias, Schumann aludiu implicitamente ao caráter musical dessa parte do Partenon: poderia fazê-lo ao todo. Aqui se vê, se palpa, se ouve o "cântico das colunas". A propósito de colunas, a idéia mais moderna que conheço é a de Stendhal quando escreve, ligando-se de resto à posição socrática: "Rien ne conduit aussi vite au bâillement et à l'épuisement moral que la vue d'un fort beau paysage; c'est dans ce cas que la colonne antique la plus insignifiante est d'un prix infini: elle jette l'âme dans um nouvel ordre de sentiments". A coluna tornou-se pois a árvore do homem moderno, que de resto agora a suprime.
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A figura do templo (mesmo em grande parte destruído), base material do conceito sacro, permanece. Aqui na Acrópole, fazendo funcionar a memória, tento reconstituir o trabalho imenso da edificação deste templo, do qual certamente participava toda a "pólis", inclusive tantos olhos ilustres, tantos cérebros que até hoje conseguem dialogar conosco. O Partenon é uma ruína que, sustentada pela força da luz, ressuscita cada dia, corpo glorioso.
O Museu Nacional ateniense nos ajuda a completar nossa informação da Acrópole e da arte grega. Além da descoberta da estela de Diotima, personage que, desde Platão a Hölderlin, nos é tão familiar, o impacto maior virá das estátuas dos Kouroi, jovens nus, em particular a do Kouros arcaico encontrado em Milo, obra de um artista ilhéu, datando do 6.º século antes de Cristo. Essas esculturas propõem-nos uma interpretação do homem grego, entre o fato cotidiano e o enigmático, entre a linha concreta e a indefinível. São emblemas de uma civilização que encontrou sua forma plástico-literária, hesitando em dar o salto mortal no desconhecido; mas a fronteira entre os dois mundos, o físico e o sagrado, não resulta assim tão clara.
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O Museu Nacional ateniense nos ajuda a completar nossa informação da Acrópole e da arte grega. Além da descoberta da estela de Diotima, personage que, desde Platão a Hölderlin, nos é tão familiar, o impacto maior virá das estátuas dos Kouroi, jovens nus, em particular a do Kouros arcaico encontrado em Milo, obra de um artista ilhéu, datando do 6.º século antes de Cristo. Essas esculturas propõem-nos uma interpretação do homem grego, entre o fato cotidiano e o enigmático, entre a linha concreta e a indefinível. São emblemas de uma civilização que encontrou sua forma plástico-literária, hesitando em dar o salto mortal no desconhecido; mas a fronteira entre os dois mundos, o físico e o sagrado, não resulta assim tão clara.
MENDES, Murilo.
"Grécia e Atenas"
in Carta Geográfica, in Transístor, Nova Fronteira, 1980.
1 comentário:
Permitam-me um pequeno comentário acerca da música: na minha opinião, escolheste a melhor interpretação da Grande Sinfonia. Prefiro a de Mackerras às de Karajan ou Pinnock, por exemplo.
Um abraço!
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