A ânsia de riqueza é a responsável por estas mudanças. Nos tempos de antanho, quando a virtude por si só granjeava respeito, floresciam as artes liberais e havia entre os homens grande disputa, de forma a que nada que pudesse aproveitar aos séculos vindouros ficasse na ignorância por muito tempo. Por isso, caramba, Demócrito tratou de espremer o suco a todo o género de plantas e, para não ficar escondida a energia de pedras e arbustos, consumiu a vida no meio de experiências. Eudoxo, por sua vez, encaneceu no cume de um monte altíssimo, com o intuito de compreender os movimentos dos astros e da abóbada celeste; e Crisipo, a fim de preparar-se para a meditação, por três vezes purgou o espírito com heléboro. E no que se refere às artes plásticas, temos Lisipo, que morreu de fome de tão absorto estar no esboço de uma estátua; Míron, que esteve a ponto de insuflar no bronze a alma de homens e de animais, não encontrou continuador. Nós, porém, mergulhados em vinho e no putedo, antes nos limitamos a censurar a antiguidade, a aprender e a transmitir os seus defeitos. Onde está a dialéctica? Onde a astronomia? Onde o muito avisado caminho da sabedoria?
[...]
Em suma: não te admires por a pintura estar em decadência, se aos deuses todos e aos homens parece mais belo um monte de ouro do que as obras de Apeles e de Fídias, esses pobres gregos amalucados.
PETRÓNIO.
Satyricon, 88, Cotovia, 2005.
(Trad.: Delfim F. Leão)
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