quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

A fábula de Anfion


2. O acaso




No deserto, entre os______________________________Encontro
esqueletos do antigo______________________________com
vocabulário, Anfion,______________________________ o acaso

no deserto, cinza
e areia como um 
lençol, há dez dias

da última erva
que ainda o tentou
acompanhar, Anfion,

no deserto, mais, no
castiço linho do
meio-dia, Anfion,

agora que lavado
de todo canto
em silêncio, silêncio

desperto e ativo como
uma lâmina, depara
o acaso, Anfion.


*



O acaso
__ _ _Ó acaso, raro
__ataca___ _ animal, força
e faz soar_ __de cavalo, cabeça
 _a flauta___ que ninguém viu;
____________ó acaso, vespa
____________oculta nas vagas
____________dobras da alva
____________distração; inseto
____________vencendo o silêncio
____________como um camelo
____________sobrevive à sede,
____________ó acaso! O acaso
____________súbito condensou:
____________em esfinge, na
____________cachorra de esfinge
____________que lhe mordia
____________a mão escassa;
____________que lhe roía
____________o osso antigo
____________logo florescido
____________da flauta extinta:
____________áridas do exercício
____________puro do nada.




NETO, João Cabral de Melo.
"Fábula de Anfion" 
in Psicologia da Composição, in Poesia Completa, INCM, 1986.

Sem comentários: